Legendarium

Ainulindalë – análise geográfica

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Regiões Imateriais:

 

Salões Eternos (ou Salões sem fim, Palácio eterno, Mansões Eternas): uma das primeiras coisas criadas por Eru Ilúvatar. É um considerado um lugar completamente imaterial onde o próprio Eru faz a sua moradia, sendo imaterial é eterno e infinito, não tendo limites em tempo, espaço etc. Sabe-se apenas que os Salões Eternos se difere do abismo e do Vazio. Durante a criação do mundo material alguns dos Ainur deixaram os Salões Eternos, mas a grande maioria permaneceu junto a Eru. Existem duas partes dos Salões Eternos: o Firmamento e o Abismo. O Firmamento é a parte dos Salões Eternos considerada mais elevada. Enquanto o Abismo é a parte mais profunda dos Salões Eternos. Não existe a noção de tempo nos salões eternos.

Belas Regiões: são os lugares criados por Ilúvatar para que os Ainur habitassem. São separadas do Vazio e estão nos Salões Eternos.

Vazio: O Vazio é a ausência de toda a existência, seja ela material ou imaterial. Melkor perambulou pelo Vazio a procura da Chama Imperecível, porém não teve sucesso, pois ela não está no Vazio. O Vazio está separado de tudo o que existe, não se sabe se é finito ou eterno, por isso é preferível dizer que essa é uma região não habitada e sem existência. Não existe a noção de tempo no Vazio.

Regiões Materiais:

 

Ëa (o mundo criado): é tudo o que foi criado materialmente por Eru Ilúvatar, através da Chama Imperecível. Seria o equivalente ao nosso Universo (que inclui todos os astros, planetas, galáxias etc). Está caracterizado por matéria, tempo e espaço. Dentro de Ëa se situa os Círculos do Mundo.

Círculos do Mundo: é a região que está entre Arda e o Vazio. Estão nos Círculos do Mundo os astros (Sol, Lua, estrelas etc). É dividido em três regiões básicas: Vista (onde ficam as nuvens e os pássaros podem voar), Ilmen (região atmosférica acima de Vista, onde fica a lua), Menel (região onde ficam as estrelas, alguns dizem ser o mesmo que Vaiya), Vaiya (região acima de Ilmen onde fica o Sol, seria o equivalente a nossa galáxia).

Arda: seria o equivalente ao planeta Terra.

 

Artigos

A Mulher do Marinheiro

by Júnior Gonçalves

O conto de Aldarion e Erendis, encontrado em “Contos Inacabados”, é uma história recheada de altos e baixos, personagens controversos e de muitas intrigas. Decidi escrever este texto porque, neste capítulo, surgem algumas discussões que divido em dois tópicos:

  1. O papel de Erendis nos costumes Númenorianos.
  2. Erendis e o feminismo.

É importante dizer que, caso não tenha lido esta história ainda, irá receber alguns “spoilers”. Se mesmo assim optar por continuar a leitura, espero que sinta-se inspirado para investigar mais e contribuir com seu comentário.

O Papel de Erendis nos Costumes Númenorianos

Criada no ano 32 da segunda era, a ilha de Númenor foi um presente dos Valar para os homens com o propósito de servir de refúgio e paz após a grande guerra. A ilha estava situada entre as terras imortais dos Valar e a Terra-Média.

Ilha de Númenor
Ilha de Númenor

O quinto rei da descendência de Elendil foi Meneldur, que se casou com Almarian. Seus filhos foram Anardil (mais tarde chamado de Aldarion), Ailinel e Almiel.

Recontar a história não é o meu objetivo aqui, portanto não irei me prolongar em alguns detalhes. Resumidamente: Aldarion foi um herdeiro do trono muito incomum e amava navegar e se deter na arte de construir navios, pouco se preocupava com os assuntos internos e políticas de Númenor.

Aos 25 anos, Aldarion ganhou seu primeiro barco e fez sua primeira grande viagem, onde conheceu Círdan e Gil-galad, seu amor pela navegação só aumentou. Seu pai não aprovava tais atitudes e temia pelo futuro da ilha, e então limitou o corte de árvores para construção de embarcações, mesmo assim Aldarion não refreou seu desejo pelo mar, e decidiu explorar madeira na Terra-Média, criando assim o primeiro porto númenoriano (Vinyalonde).

Almarian apoiava seu filho em tudo que fazia e teve forte participação na apresentação de Erendis à Aldarion. Em uma das festas dadas pelo rei, veio do oeste da ilha um homem chamado Beregar, da descendência de Beor, acompanhado de sua filha, uma mulher de grande beleza, cabelos escuros e límpidos olhos cinzentos, que acabou tornando-se dama da casa da rainha, seu nome era Erendis. Ela logo se encantou por Aldarion:

Mas Erendis avistou Aldarion que passava a cavalo, e por sua beleza, e pelo esplendor de seu porte, ela quase não tinha olhos para mais nada (…) Erendis julgava que a posição de Aldarion era elevada demais. No entanto, depois disso, não olhou com estima para nenhum homem, e dispensou todos os pretendentes.

Aldarion também notou Erendis, porém não prosseguiu em corteja-la e continuou com suas viagens.

Em Númenor existia o costume de que, antes de qualquer embarcação sair em alto mar, uma mulher, normalmente parente do capitão, depositava o Ramo do Retorno na proa, que provinha da árvore Oiolaire, que em Quenya significa “Sempre-Verão”, até mesmo os eldar usavam estes ramos em seus navios como sinal da amizade por Ossë e Uinen (maiair de Ulmo).

Cabe aqui uma pequena curiosidade sobre este casal de maiar: Ossë, no início da história de Arda, foi corrompido por Morgoth, porém Aulë pediu encarecidamente para que Uinen o persuadisse a (voltar), e assim o fez. Desde então, Ossë e Uinen formam o casal que cuida dos mares sob ordem de Ulmo, e são muito requisitados pelos marinheiros numenorianos.

É interessante notar uma coincidência entre a história deste casal e a história de Aldarion, onde Erendis, em determinado momento, tenta persuadi-lo a voltar de uma viagem e ficar com ela na ilha,  porém a inversão de papéis é notável: enquanto Uinen tentava persuadir Osse para voltar pros mares, Erendis por sua vez, tentava persuadir Aldarion a ficar em terra firme.

O Rei Meneldur, enfurecido com as atitudes de seu filho, proibiu que a Rainha levasse o Ramo do Retorno ao navio de Aldarion, foi então que Erendis se voluntariou para levar, e nesta atitude simples, foi que o príncipe olhou com amor para ela:

Erendis lá chegou, por pouco que apreciasse o ruído e a agitação do grande porto e os gritos das gaivotas. Aldarion saudou-a com espanto e alegria.

 — Trouxe-lhe o Ramo do Retorno, senhor, da Rainha — disse ela.

— Da Rainha? — repetiu Aldarion em outro tom.

 — Sim, senhor, mas pedi a permissão dela para assim fazer. Outros além da sua própria família hão de alegrar-se com seu retorno, assim que seja possível.

Nesse momento, Aldarion pela primeira vez olhou com amor para Erendis; e por muito tempo ficou de pé na popa, olhando para trás.

Nota-se aqui o importante papel da mulher na cultura numenoriana. As mulheres eram responsáveis por levar “sorte / esperança de retorno” aos marinheiros. Pelo fato de Aldarion amar muito o mar, este amor foi estendido a Erendis, quando notou a preocupação da parte dela em manter tal costume.

Em uma das viagens, Aldarion trouxe um presente para Erendis, um diamante que ela mandou engasta-lo e o transformou em uma coroa e, a partir daí, foi chamada de Elestirne, que signifca “A Senhora da Fronte Estrelada”. Mais tarde este ato influenciou toda a geração de Reis númenorianos, que passaram então a usar uma coroa com pedras preciosas.

Avançando na linha do tempo, os eventos que acontecem posteriormente, culminam em um novo costume númenoriano. Devido aos grandes conflitos que Aldarion e Erendis tiveram no relacionamento, Tar-Aldarion decidiu que a linhagem real só poderia se dar por descendentes de Elros, pois estes tinham a vida estendida:

Aldarion acrescentou que o Herdeiro do Rei não deveria se casar, a não ser na linhagem de Elros, e que todos os que fizessem o contrário deixariam de ser elegíveis à posição de Herdeiro. Diz-se que essa estipulação decorreu diretamente do casamento desastroso de Aldarion com Erendis, e de suas reflexões a respeito; pois Erendis, não sendo da Linhagem de Elros, tinha um tempo de vida mais reduzido, e Aldarion cria que nisso residia a raiz de todos os seus aborrecimentos.

Em outra ocasião, após o nascimento de Ancalime (única herdeira do casal), Aldarion decidiu viajar novamente e isso irritou profundamente Erendis. Esta viagem marca o fim do relacionamento, tamanho descontentamento que causou. Chegado o dia de sua partida, ninguém veio colocar o Ramo do Retorno na proa de seu barco, acontecimento que perturbou muito Aldarion, porém a esposa de outro marinheiro cumpriu com a tradição. Este foi um grande marco que influenciou posteriormente esse costume e a decisão de não colocar mais o ramo:

“The Mariner’s Wife” by Turner Mohan.
“The Mariner’s Wife” by Turner Mohan.

Está registrado que não colocou na proa de Hirilonde nenhum ramo de oiolaire, e sim a imagem de uma águia de bico dourado e olhos feitos de pedras preciosas, que era presente de Círdan. Lá estava pousada, pela arte de quem a fizera, como que pronta a voar certeira até uma meta distante que divisara. — Este sinal há de nos conduzir ao nosso alvo — disse ele. — Da nossa volta que cuidem os Valar, se nossos atos não lhes desagradarem.

É curioso que, devido a um relacionamento ruim, todas as gerações de Reis foram afetadas. Mesmo que um herdeiro se apaixonasse verdadeiramente por uma mulher, se ela não fosse da linhagem de Elros, o casamento não seria permitido. E que também, o costume do Ramo do Retorno, fora quebrado e trocado.

Erendis e o Feminismo

Não pretendo discutir aqui quaisquer correntes filosóficas do feminismo, e nem acusar alguma das partes (Aldarion ou Erendis) pelos seus atos. Vejo este capítulo como um conto importante para a narrativa de Tolkien, uma vez que é uma obra recheada de intrigas que se aproximam da vida real.

O fato de Tolkien escrever sobre o descontentamento é algo relevante, da parte de Erendis, por ter sido “abandonada”. Isto está muito evidente neste trecho do texto, que mostra como ela via os homens de Númenor:

Os homens de Númenor são meios-elfos (disse Erendis), em especial os nobres; não são nem uma coisa nem outra. A vida longa que lhes foi concedida engana-os, e brincam no mundo, crianças na mente, até que a velhice os encontre — e então muitos só abandonam o jogo ao ar livre pelo jogo em suas casas. Transformaram sua brincadeira em assuntos importantes e assuntos importantes em brincadeira. Gostariam de ser artesãos, mestres das tradições e heróis, tudo ao mesmo tempo; e as mulheres são para eles apenas chamas na lareira — para outros cuidarem até que eles se cansem de brincar, à tardinha. Todas as coisas foram feitas para servi-los: as colinas são para pedreiras, os rios para fornecer água ou girar rodas, as árvores para tábuas, as mulheres para a necessidade de seu corpo ou, se forem belas, para adornar sua mesa e seu lar; e crianças para serem provocadas quando não há mais nada para fazer — mas brincariam da mesma forma com as crias dos seus cães. São corteses e bondosos com todos, joviais como cotovias pela manhã (se brilhar o sol), pois nunca se encolerizam se puderem evitá-lo. Os homens devem ser alegres, afirmam, generosos como os ricos, dando o que não necessitam. Mostram ira somente quando se dão conta, de repente, de que existem outras vontades no mundo além da sua. Então são implacáveis como o vento do mar se qualquer coisa ousar se opor a eles. Assim é, Ancalime, e não podemos alterar isso. Pois os homens formaram Númenor: os homens, esses heróis de outrora dos quais eles cantam — de suas mulheres ouvimos falar menos, exceto que choravam quando seus homens eram mortos. Númenor devia ser um repouso após a guerra. Mas. quando se cansam do repouso e dos jogos da paz, logo voltam ao seu grande jogo, assassinato e guerra. Assim é; e fomos postas aqui entre eles. Mas não temos de consentir. Se também nós amamos Númenor. vamos desfrutá-la antes que eles a arruinem. Também nós somos filhas dos grandes, e temos nossas próprias vontades e coragem. Portanto não se curve. Ancalime. Curve-se um pouco uma vez, e eles a curvarão mais até que você esteja inclinada até o chão. Deite suas raízes na rocha, e enfrente o vento, por muito que ele leve todas as suas folhas.

Não há muito o que acrescentar depois de tal texto, Erendis sofreu muito com a incompatibilidade de seu marido, e Tolkien coloca muito bem esse sentimento em palavras. Este trecho é prova de que Tolkien escrevia desprovido de preconceitos.

O Professor imergia em cada personagem, em cada história conseguia ver os dois lados da moeda e, por isso, construiu narrativas sem apelos emotivos enraizados em preconceitos mesquinhos. Muitas pessoas ainda o acusam de diversas inverdades, tais como de que ele era machista e racista, porém é evidente que são acusações motivadas por ignorância de seus escritos.

É possível notar que Erendis tinha consciência da cultura machista em Númenor, e ela exigia igualdade de gênero. Nota-se também um grande amadurecimento das suas ideias quando, no início, ela se mostra muito emotiva e vingativa para com os homens:

Pois Erendis só tinha serviçais em sua casa, e todas eram mulheres. E procurava sempre moldar a filha conforme sua própria mente, e alimentá-la com seu próprio rancor contra os homens. Na verdade Ancalime raramente via algum homem, pois Erendis não usava pompa, e seus poucos serviçais da fazenda e pastores tinham uma habitação ao longe. Outros homens lá não chegavam, exceto raramente algum mensageiro do Rei, que logo ia embora e logo partia a cavalo, pois aos homens parecia haver na casa um ar gélido que os punha em fuga, e enquanto estavam lá sentiam-se constrangidos a falar a meia voz.

Em outro momento, anterior aos acontecimentos que culminaram neste trecho, a mãe de Erendis (Núneth), dá um conselho para ela:

Uma mulher tem de compartilhar o amor do marido por seu trabalho e o fogo do seu espírito, ou então transformá-lo-á em algo que não pode ser amado.

Podemos concluir que Erendis é uma personagem feminista e, devido a um grande trauma em seu relacionamento, ela se rebela contra a cultura machista de Númenor. 

O papel de Erendis na história de Númenor é de suma importância, pois ela foi a primeira rainha a se opor às decisões do rei (seu marido) e aos costumes da época, ao não colocar o Ramo do Retorno no barco de Aldarion). Foi também Erendis quem criou a tradição do uso da coroa estrelada para quem governasse Númenor. Porém, seu final não é feliz:

De Erendis está dito que, quando a velhice se abateu sobre ela, negligenciada por Ancalime e em amarga solidão, ela voltou a ansiar por Aldarion (…) por fim deixou Emerie e viajou incógnita e desconhecida até o porto de Rómenna. Lá parece que encontrou seu destino; mas somente as palavras “Erendis pereceu na água no ano de 985” permanecem para indicar como isso ocorreu.

A história de Aldarion e Erendis traz grandes lições de relacionamento, é necessário haver um respeito mútuo entre o casal, saber apreciar as particularidades um do outro, e é necessário também ter humildade para aceitar as diferenças de opiniões.

Aldarion é descrito como um homem orgulhoso que errou em diversos momentos de sua vida, porém contribuiu muito fazendo o contato entre Númenor e a Terra-Média, mesmo à custa de seu relacionamento.

Sobre Filmes

Peter Jackson, Boyens e Richard Armitage falam sobre o segundo filme de O Hobbit

Em rápida entrevista dada ao site http://www.vulture.com. O diretor Peter Jackson e Phillypa Boyes falam sobre as filmagens do segundo filme de O Hobbit.
 “Ótima história contada!” diz Boyens, quando perguntamos porque não vimos Thráin, pai do  líder dos anões, Thorin Escudo de Carvalho e um dos portadores de um Anel de Poder, que ganhou de Gandalf um mapa e uma chave. (Gandalf tinha encontrado Thráin próximo de morrer em Dol Guldur) “Nós tínhamos tentado colocar no início desse filme, e então mudamos,” ela diz. Isso significa que veremos esse momento em um flashback ou prólogo de A Desolação de Smaug? “Sim, será muito importante que façamos isso. Encontraremos Thráin, e talvez seja em circunstâncias infelizes. E pode envolver tortura. A descoberta de quem ou que está em Dol Guldur” i.e., Sauron, conhecido apenas neste ponto como o Necromante – “é uma parte fantástica dessa história, então, sim, é claro que fomos lá.”
Há um grande potencial, não?” Jackson brinca. “Você nunca sabe o que já foi filmado. Mas certamente existe muito material, e faremos um bom uso dele.” Jackson diz que acabou de editar A Desolação de Smaug (“Nós filmamos, cortamos e apenas precisamos refiná-lo”) e antecipa um trailer no meio do próximo ano. Lá e de Volta Outra Vez tem mais escrita e filmagem pela frente, incluindo a cena da Batalha dos Cinco Exércitos. “Não quero dar mais nenhum spoiler,” diz ele, “ vocês vão ter esperar mais um ano ou dois!”

 

 

Em entrevista concedida a revista Empire, o ator Richard Armitage (que interpreta o personagem o Thorin Escudo de Carvalho) confirmou que haverá novas filmagens da batalha dos cinco exércitos e mais filmagens por mais 10 semanas.“A batalha foi adiada para o ano que vem felizmente. Era algo que ninguém queria nem pensar, pois prevemos 10 (dez) semanas de filmagens intensas nessa batalha extensa, em que cada um de nós terá seu momento heróico no campo de batalha. Haverá uma luta delirante no ar (com águias enfrentando morcegos gigantes) e no chão. Mal posso esperar para ver o que Peter vai fazer com tudo isso”, disse.

Tradução: Susane Soares.

Fonte1: http://www.vulture.com/2012/12/where-was-gandalfs-backstory-in-the-hobbit.html

 

Cristina Aguiar

Contos da Cristina Aguiar – Parte 02

Dando sequencia a história de Owen e Briana, a escritoria Cristina Aguiar nos apresenta mais essa parte empolgante de uma aventura ambientada na terra média. Se você não leu o inicio dessa aventura veja AQUI A PRIMEIRA PARTE.

 

Parte 2 – Terrível Noite Para fugir

Após uma noite não dormida, Owen e Briana tentaram seguir com a normalidade do dia, como se o acontecido da noite anterior fizesse parte de um sonho ruim, embora cada um guardasse as impressões reais e assustadoras da experiência vivida. No entanto, eles se sentiam confusos e abalados o suficiente para evitarem tocar no assunto.

Enquanto acendia o fogo da oficina naquela manhã, Owen pensava nos olhos do anão e imaginava o que ele havia tentado lhe dizer, pois foi um olhar cheio de significado, caso contrário ele não estaria tão perturbado. Naquele momento, enquanto ruminava pensamentos, foi surpreendido com a entrada repentina do velho Aldair, que chegava acompanhado de alguém. Quem o acompanhava não era ninguém mais do que Zârad, o anão!

Por muito pouco o rapaz não deixa todo o carvão cair, tal foi o tamanho de seu susto. O ferreiro passou por ele como se não existisse ninguém ali, assim como o anão que o ignorou completamente. Ambos passaram por ele falando com vozes ásperas e graves, tratando de negócios. Entraram em um cômodo adjacente e suas vozes foram ficando mais baixas. Foi difícil para Owen permanecer atento ao seu trabalho. Um bom tempo depois, Zârad saía sozinho e, dessa vez, parou junto ao rapaz.

— Um anão não costuma dar conselhos, sejam eles bons ou maus. Mas quando faz isso, é bom que sejam ouvidos. Aviso-lhe: não durma essa noite. Coisas desagradáveis podem acontecer.

Ele se foi deixando Owen com os olhos arregalados de espanto e medo. As perguntas martelando em sua mente. Voltou à realidade com a voz rude e grosseira do ferreiro.

— Não fique aí parado, garoto! Temos uma encomenda grande para hoje. Ferraduras novas para os pôneis dos anões. Eles terão uma grande viagem pela frente, e trazem muitas riquezas nos bolsos. Por isso, aqueça logo esse fogo e comece a trabalhar!

Então, eles iam partir! Foi tudo o que Owen conseguiu pensar. E tinham pressa! Eles haviam chegado no dia anterior, o que os motivava a partir tão depressa? Teria sido a invasão do estábulo o motivo?

 

Briana, que observava através de uma janela na cozinha, viu a partida do anão. O seu coração, entretanto, continuava batendo de forma desordenada. Ela e Owen não haviam tocado no assunto de sua infeliz aventura, e ela temia que o velho Aldair os punisse por conta de algo que o anão tenha dito. Ela viu com alívio que o ferreiro saía da oficina, e que parecia tranqüilo, podia-se dizer que até parecia feliz!

Ela correu para falar com o irmão e o encontrou pálido e sentado em uma banqueta, com os dedos brincando com o pingente do cordão.

— Owen! Eu vi o anão! O que ele queria?

Owen, no lugar de se assustar com sua entrada repentina, apenas virou-se para ela com os olhos distantes.

— Eles vão partir amanhã, Briana.

— Partir? Que estranho! Eles chegaram ontem…

A estranheza estava no fato de que geralmente os viajantes detinham-se por ali pelo menos por uma semana. Era o tempo de descansar, reabastecer os suprimentos e estudar as melhores rotas.

— A caixa, Briana…

— Você ainda está pensando naquela maldita caixa? Tivemos sorte de ter saído vivos daquele estábulo ontem! Tudo por causa daquela caixa.

Owen levantou-se e pegou no braço da irmã com uma expressão muito séria no rosto, o que a fez parar de falar.

— Vai acontecer alguma coisa. O anão me disse.

— Ele te disse? E você vai confiar nas palavras dele?

— Não, Briana, eu não vou confiar em ninguém. A única pessoa em quem confio é você. Mas devemos ficar alertas. Seria estupidez não ficar. Afinal “um anão não costuma dar conselhos, sejam para o bem, sejam para o mal”.

— Do que você está falando, Owen?

Ele respirou fundo e encarou a irmã.

— Escute-me, Briana, eu preciso trabalhar agora. Enquanto faço isso, arrume nossas coisas. Junte tudo o que seja necessário levar numa viagem, mas que seja leve para carregar.

Briana arregalou os olhos.

— Vai fazer o que estou pensando?

— Tudo o que sei é que vou seguir um conselho que, com certeza, não foi dado à toa.

 

Chovia naquela noite. O velho Aldair, depois de ter bebido algumas canecas de cerveja no bar da estalagem, recolheu-se ao seu quarto e caiu num sono profundo. A casa estava silenciosa. Era uma casa grande, porém simples. Um pequeno muro levava ao jardim mal cuidado e à porta da frente. A oficina tomava conta de quase toda a parte posterior da casa, deixando um pequeno espaço para a cozinha, e servia de entrada e local de trabalho ao mesmo tempo. Uma porta abria-se para um longo corredor onde ficavam os quartos. Owen dormia no último quarto, próximo a porta dos fundos que dava acesso a um quintal sem muros. O quarto de Briana era o primeiro, mais perto da cozinha. O ferreiro dormia no maior quarto, que ficava no meio do corredor, e que antes pertencera aos pais de Owen e Briana.

O silêncio foi quebrado pelo ranger de uma porta. Era a porta dos fundos, cujo barulho já era bastante característico. Pisadas firmes e pesadas podiam ser ouvidas sobre o piso de madeira. Aconchegados em silêncio, dentro da pequena despensa junto à cozinha, Owen e Briana aguardavam o momento certo para fugir. As palavras do anão provaram ser confiáveis, e a menina não se arrependia de ter dado ouvidos ao irmão. Aquilo vinha confirmar suas suspeitas de que a invasão do estábulo não ia ficar barata para alguns dos anões. Quando eles ouviram o ranger das portas dos quartos sendo abertas, saíram de seu esconderijo e alcançaram a oficina. Abriram a porta sem problemas e saíram para a chuva, agachados no jardim. Eles já podiam ouvir o barulho de coisas sendo quebradas e pragas sendo desferidas. Owen tinha pressa. Ele queria aproveitar a chuva forte e correr em direção ao portão da cidade. Lá, ele sabia existir uma abertura que possibilitaria a passagem.

Ele puxou o braço de Briana e ambos atiraram-se para fora do portão. A rua estava deserta e escura. Chovia ao ponto de deixar o caminho turvo. Quando tudo parecia estar dando certo, eles viram na distância o vulto de dois anões guardando a estrada, com machados nas mãos. Briana empurrou o irmão para uma esquina, antes que fossem vistos.

— E agora? Não podemos ir por ali – ela sussurrou.

— Então, nós teremos que pegar a estrada para o Leste e dar a volta pelas colinas até alcançarmos os campos.

— Teremos que passar pela estalagem novamente.

Ela tinha razão. E lá estariam os anões invasores, aguardando por eles. Owen não sabia o que fazer. De repente, tudo parecia estar dando errado. Foi quando ele ouviu o som de luta e gritos abafados. Aquilo o surpreendeu. Espiaram a rua e não viram mais os anões que montavam a guarda. No lugar deles, com as pernas abertas e as mãos na cintura, estava Zârad.

— Eu sei que vocês estão aí! Saíam logo e me sigam. Não foi de meu agrado bater em meus irmãos, mas anões costumam pagar suas dívidas. Fiz o que fiz, mas não poderei mais voltar. Agora, sou a única chance de vocês. Sigam-me, vamos!

Owen e Briana se entreolharam.

— O que ele quis dizer com “pagar suas dívidas”? – ela perguntou.

— Eu não sei, mas é a terceira vez que ele nos ajuda.

Briana agarrou o braço do irmão.

— Ele é um anão como os outros, Owen! Não confio nele.

— Ele nos ajudou de novo, Briana… – ele repetiu.

Ela soltou um lamento.

— É aquela caixa, não é? Você só pensa nela.

— E você, não? – ele a encarou.

Briana ficou sem respostas e o anão grunhiu impaciente.

— Fiz a minha parte e vou seguir o meu caminho desde já! Sigam-me agora ou não terão outra oportunidade.

Owen olhou suplicante para Briana. Ela finalmente afrouxou a mão que o agarrava.

— Vamos, então. Se o nosso destino é andar com anões, prefiro escolher aquele que nos ofereceu ajuda.

O rapaz sorriu e a puxou pela mão. Zârad já ia muito à frente. Ao chegar ao portão, ele deu um saco de moedas na mão do porteiro e puxou dois pôneis que estavam amarrados a uma árvore ali perto. Eles passaram para fora do portão e da cidade. O anão montou em um dos pôneis. No outro estava estocada a bagagem. Eles perceberam que teriam que andar.

— Você sabia o que ia acontecer? – Owen teve coragem de perguntar.

Zârad puxou o pano que envolvia a sua sela e revelou a caixa de madeira, fazendo o coração de Owen bater em disparada.

— Isso os atraiu, e eu sei o motivo. Mas não é hora e nem lugar para falar sobre isso. A estrada é longa e logo estarão atrás de nós. Não é tempo de falar, mas de correr.